"O inimigo mais perigoso que você poderá encontrar será sempre você mesmo." ( Friedrich Nietzsche )

sexta-feira, 29 de junho de 2007

Mestres dos Quadrinhos Eróticos - Serpieri III

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Fellini, por Manara

“Federico Fellini, morto em 1993, viveu o suficiente para se declarar um fervoros fã de Druuna. Quando o fez publicamente, garantiu, no entanto, que não era a beleza plástica da heroína de Serpieri o que mais atraía sua atenção e, sim, os monstros disformes que compunham seu mundo bizarro. Certamente, não estava falando sério, uma vez que poucos cineastas reverenciaram tanto a mulher, suas formas e sensualidade quanto o diretor de “A Cidade das Mulheres”.
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Marcello Mastroianni, em Cittá Delle Donne
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E não restam dúvidas de que, assim como no caso de Manara, muitas de suas personagens povoaram os sonhos do desenhista de Druuna na adolescência e na juventude e reapareceram em sua imaginação no momento em que ele idealizou as formas de sua heroína. Afinal, sua famosa criação resultou da mistura de várias mulheres que alimentaram o imaginário ocidental na segunda metade do século XX. Seu rosto, seu corpo e suas histórias são uma mescla de muitas fantasias e de variadas referências da vida real e da ficção, principalmente do cinema.
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Druuna nasceu com formas bem definidas, mas, no decorrer dos anos e da abertura cada vez maior nos quadrinhos me em relação à censura, suas curvas foram ainda mais redimensionadas e as histórias se tornaram mais picantes. A cada episódio que surgia nas bancas e livrarias, ela dava a impressão de ganhar um pouquinho mais de coxas, bunda e seios. De algum modo, seu autor acompanhou o que se chama de evolução dos tempos quanto à pressão moral nas artes.

Como o período de produção e de lançamento de cada história sempre foi razoavelmente longo, em torno de dois anos, Serpieri pareceu medir os passos de sua ousadia e não deixou de seguir adiante quanto a experimentar a temática sexual em suas muitas possibilidades – assim como Crepax e Manara, tornou-se marcadamente um sadomasoquista com Druuna, numa espécie de obsessão dos artistas italianos pelo prazer a partir do sacrifício físico.

Como logo soube dos limites de tolerância de seus editores nos muitos países mais ou menos liberais onde editou seus quadrinhos – nos mais fechados, sua publicação é ainda algo impensável -, porém, o desenhista procurou não exagerar nas tórridas cenas sexuais que Druuna costumou provocar.
Para atender ao público interessado em desenhos mais picantes, aliás, entre alguns episódios, Serpieri produziu três álbuns de esboços que chamou sugestivamente de:
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"Obsession"
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."Druuna X-1"
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Nesta edição, o autor conversou com sua personagem e lhe pediu para que fizesse sexo sem pudores com outros personagens apenas para satisfazer sua tara de voyer:





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Finalmente, no terceiro, escreveu pequenos textos que acompanharam cenas mais escancaradas e mais coloridas.
A qualidade e a impressionante uniformidade do traço que Serpieri conseguiu preservar no decorrer de quase duas décadas de produção das aventuras de Druuna o ajudaram a formatar o hiper-realismo quase fotográfico que ele buscou para os personagens de suas histórias. Foram o resultado do esforço de um artista obstinado em alcançar sempre a perfeição. “Eu sou um perfeccionista, eu não retoco meu trabalho, eu o refaço”.
No começo, ele não escrevia nunca um roteiro propriamente dito, buscava um texto concebido como um romance. “Eu desenho pouco a pouco, depois exebuto o roteiro progredindo em função das imagens”. Assim, na fase de produção, seus diálogos são durante muito tempo embrionários, desenvolvidos num processo de criação bastante particular, com predominância da imagem. “Eu vejo a história, eu volto constantemente atrás. Daí minha dificuldade de trabalhar sobre um roteiro de outra pessoa”.
Nenhuma personagem do cinema ou das histórias em quadrinhos em todos os tempos reuniu tantos atributos físicos juntos quanto Druuna. Tudo isso, à primeira vista, levou a uma leitura superficial da heroína e, não raro, preconceituosa, feitas muitas vezes a partir de princípios morais. Inclusive de um bom número de críticos, que a transformaram num clichê erótico. E dos moralistas, que sempre tiveram muito que se sentir incomodados com ela – tanto que suas histórias continuam inéditas em muitos países da Europa, Ásia e América.
Essas duas categorias de críticos reclamam,por exemplo, de uma suposta superficialidade. Ou seja, de que os motivos mais fúteis levam-na a tirar a roupa ou a andar freqüentemente pelada. Ou que ela é excessivamente promíscua. Não se deve, porém, apenas atribuir juízo de valor na decisão de Druuna em fazer sexo. Há algo mais proposital nisso.
Ela o faz porque gosta, tem direito e, como foi dito, principalmente por ser uma forma de se manter viva ante as ameaças de criaturas monstruosas e de renovar suas energias pelo prazer. Ao mesmo tempo, existe uma simbologia em seu comportamento. A heroína transmite a seus parceiros o sentido de perceberem a vibração da vida em seus corpos por meio do orgasmo, num mundo moribundo e asfixiante.
A “sexy” Druuna, com sua conduta libidinosa e de aparente submissão, rendeu severas críticas de feministas européias e a desaprovação de muitas outras nos países onde suas aventuras foram publicadas em diferentes continentes. Da parte dos homens, claro, sempre vieram fervorosos aplausos. Nesse aspecto, Serpieri não concorda que faz pornografia e que sua obra seja carente de sutilezas ao mesmo tempo em que seria agressiva à moral.

Há, na sua opinião, muitas definições para a palavra pornografia. “Afirma-se que é a reprodução de um ato obsceno. Creio que possam chamar meu trabalho de pornográfico. Não me incomodo. Mas vejo que o conceito de pornografia foi contaminado por um preconceito, por uma visão hipócrita do mundo e do sexo”. “Ora”, prossegue ele, “por que a chamada “obra erótica” esconde o ato sexual? Talvez porque o considerem uma ofensa, uma imundície. Eu, ao contrário, creio que o ato sexual é belo, natural e uma das expressões mais fantásticas da vida”.

Para ele há, na verdade, interesse moral e econômico por trás dessa discussão sobre a imagem do sexo. “A tradição determina que o prazer deva ser reprimido. Dessa forma, o homem vive sempre frustrado, minado pela culpa. Assim, é mais fácil dominá-lo. Dou a Druuna uma grande responsabilidade, que é denunciar esse sistema de falsidade”.
Para ele, seu desenho ultrapassa o (pré) conceito de pornografia e é, sem dúvida, o mais intrigante no conjunto da obra, porque inclui reflexão, que ele destaca cmo importante atividade do pensamento. “O objeto desenhado carrega os sentimentos de quem o produziu, essa é a chave do entendimento para esse fenômeno. Portanto, parece-me mais carregado de significado do que uma foto”.


A visão de Serpieri sobre erotismo e pornografia sem dúvida ajuda a comprender o tom que procurou desenvolver em Druuna. Defensor incondicional da liberdade de expressão, assim como Crepax e Manara, ele considera vulgar, por exemplo, o espírito obtuso e o moralismo em qualquer forma de arte. “A representação do sexo não tem nada de vulgar, exceto quando o sexo é mitificado ou ligado à violência”. E não tem o receio de polemizar: a pornografia como representação repetitiva dos atos sexuais em sua continuidade é, para ele, algo maçante, mas não vulgar.
O fato de não abrir mão do livre direito de criar e falar de sexo, no entanto, trouxe-lhe problemas com a censura, em alguns episódios que viraram notícia. Na França, berço dos modernos quadrinhos eróticos de vanguarda ao lado da Itália, quando sua editora, a Dargaud, foi vendida para Média Participation, seu catálogo adulto Image Passion – do qual a série de álbuns de Druuna fazia parte – foi negociado para outro editor.
Os novos donos alegaram que o conteúdo da personagem não estava de acordo com a sua ética, e sua publicação foi interrompida. Na mesma época, na Charles-Pilote, que publicava a heroína, o segundo episódio foi interrompido porque queriam censurar certas passagens de sexo. “Eu os mandei se danarem e fui embora”. Serpieri também teve problemas nos EUA. Num dos primeiros episódios publicados na “Heavy Metal”, numa cena em que aparece um pênis, a parte saiu com uma tarja porque foi associada à pornografia.
A polêmica permanente sobre a natureza das obras eróticas que cerca o trabalho de Serpieri tem feito com que, há mais de uma década, ele participe de palestras sobre sua obra pelos quatro cantos do planeta e a defenda com argumentos bem construídos e convincentes. Trata-se de um esforço para mostrar que Druuna não é apenas sexo. E só uma visão preconcebida pode defender isto. O apocalíptico mundo do futuro em que ela sobrevive com terríveis criaturas também merece atenção crítica pela riqueza temática, de referências e complexidade como uma legítima arte pós-moderna.
Fellini dizia que Serpieri era por demais pessimista quanto ao futuro.
O próprio artista confessou: ”Não tenho confiança no homem, um animal que mata seus semelhantes e que se deixa dominar pelo monstro que habita suas profundezas”. Ele disse não ter muita confiança no futuro e expressou isso a partir da observação do presente, quando o incomodava a falta de interesse na cooperação e na solidariedade entre as pessoas. “Somos uma espécie que mata seus semelhantes, há problemas ambientais que não estão sendo resolvidos, o homem devasta o meio ambiente sem piedade”. Tantos monstros estupradores e máquinas assassinas em suas histórias portanto têm um propósito específico. Seriam uma alegoria para fazer crítica ao comportamento humano e provocar reflexão no leitor.


Na sua opinião “vivemos num mundo que caminha para a decadência, penso. Os homens abdicam da razão e o monstro toma conta de tudo. Não estamos resolvendo os problemas estruturais do planeta. Druuna é como uma moça de hoje, com sentimentos e temores comuns a mulheres contemporâneas. Ela é bela e representa um contraste nesse ambiente de deterioração. Em sua beleza e candura residem os meios de uma salvação”. Serpieri lembra que, nessa linha, o pintor espanhol Francisco Goya (1746-1828) dizia que “o sono da razão vira monstro”.

Francisco Goya – Caprichos, nº 62

Francisco Goya – Caprichos, nº 71
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A deterioração das estruturas urbanas, acrescentou o artista, também está comprometendo a vida de bilhões de pessoas. “Como posso acreditar em melhorias? Entretanto, quero estar vigilante para afastar os monstros que se apoderam da mente dos homens”.
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Serpieri delegou a Druuna a missão de deixar uma mensagem para o futuro com o qual pretende alimentar alguma esperança quanto à preservação da humanidade. A heroína representaria a antítese, o triunfo da beleza, da natureza, da “carnalidade” e do prazer sobre o mundo espatifado. “Acho que dou a ela uma enorme responsabilidade”.
Nesse processo bem pessoal de criação e de identificação do próprio autor, o zelo que ele dedicou à narrativa textual não merece menor reverência que seus desenhos deslumbrantes. “Eu sou igualmente exigente com os textos: já acabei uma vintena de páginas da próxima Druuna, mas eu posso muito bem refazê-las inteiramente após ter acabado os desenhos”, disse ele há alguns anos. “Eu libero meus desejos profundos, tento ser o mais honesto possível, tento contar qualquer coisa que faça parte da minha realidade, daquilo que eu vi ou tento viver, não todos os dias, claro, mas, digamos, uma vez por semana”.
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15 comentários:

Anônimo disse...

Neide,

Parabéns pela série dos quadrinhos eróticos. Um trabalho muito bem feito,informativo e que pôde apresentar,também,a arte de Serpieri para muitos,como eu,que não conhecia.
Seu blog tem muito bom-gosto e continue assim! Um grande abraço do seu amigo,Miguel.

Sr do Vale disse...

Neide,
Uma observação:

Ampliei seu "logotipo", pois achei significativo, expressivo.

Para minha surpresa foi revelado o inusitado... A Lua se revela como um ser masculino, e o Sol, um ser com caracteristicas mais femininas.

Uma pergunta.
De onde vem esta escultura?

Neide, abraços Pscodélicos.

P.S.: Essa série erótica, não é interessantissíma, musas maravilhosas.

Sr do Vale disse...

Errata.

Série Interessantíssima, que de santíssima não tem nada.

O artista em sua fantasia, expõe seus desejos.

Não é fácil ver sem nada sentir.

Yan Kaô (Obashanan) disse...

Neide, infelizmente o mundo está cheio de filhos da puta. Deus gosta deles, pois o sfaz aos montes e muitos deles se revelam depois de muitos anos que são seus amigos... Estou passando por uma fase dessas com um desgraçado aí que está me ameaçando junto com outros cagões brochados... é esse tipo de babaca que f~ez com que vários blogues de progressivo - vide o Dead end, o Newprogshine e outros - fossem deletados. O meu acervo de discos de umbanda, originalmente era prá ser feito o download de raridades para todos compartilharem, assim como faz o Loronix. Acabei por optando em colocar uma faixa pro povo ouvir, em qualidade baixa, fazer o quê? Mas essa escumalha, essa chusma, essa patuléia do caralho veio querer melar a feijoada. FILHOS DA PUTA!!! Mas vai tocando que os cães ladram e caravana passa por cima deles!!! Obrigado pelos discos... me parece que está faltando o disco cinco, é isso???

Queijos!!

Neide disse...

Oi Yan,

com certeza, não irei me deixar abater por esse elemento. É claro que esse tipo de coisa vai nos despertando os piores instintos, mas o lance é não encucar...
Bem, mas vamos ao que interessa...sim, faltou o 5 pois na hora em que te passei o 1 já estava quase apagando...em breve deixarei lá, no mesmo esquema (em off) que os outros e na sequência o C.D., ok? (vamos acabar virando agentes secretos...rss)

Beijões, felicidades!

Fireball disse...

Neide,

Feliz 2008!!

Muito sucesso e força neste seu ótimo trabalho.

P.S.: adorei esses quadrinhos eróticos.

Abraço

Neide disse...

Está boa não é Fireball, nossa estou com uma quantidade quase gigante de edições variadas pra postar por aqui...aos pouquinhos, vocês verão...o legal é que estou conseguindo várias adaptações literárias, como o Germinal (Zola), Um amor de Swann (Proust), adaptações sobre a vida do Kafka...e muito mais, tudo em quadrinhos, continue acompanhando que você vai gostar bastante.

Beijos, tudo de bom!

woody disse...

Adoro esses quadrinhos da Druuna do Serpieri, eu tinha alguns exemplares (tinha uns italianos) que acabei vendendo a preço de banana em um sebo e depois me arrependi. Vou aproveitar e baixar esses aqui.

Valeu Neide, Feliz Ano Novo p vc!
WOODY

Neide disse...

Pra você também Woody, ainda vou postar vários exemplares dela por aqui...e melhor ainda, um livro sobre o Serpieri que só teve uma tiragem de 250 cópias no mundo (pelo menos isso é o que fiquei sabendo).

Beijos, tudo de bom!

Yan Kaô (Obashanan) disse...

Porra Neide, se você for como a Druuna, já estou largando tudo aqui e tomando o ônibus!! Mas que brochada final é aquela foto fo homem queimado???

Neide disse...

Hahahahahahahahaha...então fique por aí mesmo, não estou com essa bola toda da Druuna não...hahahahahaha
As gravuras finais são símbolosa da monstruosidade humana.

Beijos, felicidades pra você e A Construção!

Anônimo disse...

Gostei muito desse post e seu blog é muito interessante, vou passar por aqui sempre =) Depois dá uma passada lá no meu site, que é sobre o CresceNet, espero que goste. O endereço dele é http://www.provedorcrescenet.com . Um abraço.

ANDERSON SILVA disse...

Este seu estudo foi muito bom!!!!! Sou um grande admirador do Serpieri, amo a personagem Druuna. Achei muito interessante a relação que você fez com artista Goya.
Parabéns.

Eu tenho um breve artigo sobre o Serpieri em meu blog.
http://aminarte.blogspot.com/2008/04/drunna.html

Unknown disse...

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Anônimo disse...

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